Ecos do Simpósio de Pós-produção Criativa
De 09 a 12 de novembro, profissionais de pós-produção de cinema e vídeo voltaram suas atenções para a Cinemateca Brasileira, durante o Simpósio A Pós-produção Criativa. Com a participação de grandes mestres de várias áreas da atividade cinematográfica, com ênfase na montagem, o evento atraiu gente de várias cidades do Brasil, e foi assistido por outras tantas através de uma transmissão por streaming.
Entre os profissionais presentes estava o editor carioca Fernando Vidor, que gentilmente aceitou o convite deste blog de contar suas impressões sobre o Simpósio, respondendo algumas perguntas sobre as palestras e o que rolou nos bastidores do evento. Aproveitamos para agradecer a contribuição do Fernando e, sem mais delongas, passamos à entrevista com ele.
VideoGuru – Em linhas gerais, como foi para você participar do Simpósio A Pós-Produção Criativa?
Fernando Vidor – Assim que ouvi falar do simpósio, fiquei muito empolgado. São raras as oportunidades para discutir montagem, além da abordagem estritamente teórica ou da operação de equipamentos. A última que eu lembro foi em 2005 ou 2006, um excelente debate na Semana ABC, com presença de Daniel Rezende, Vicente Kubrusly, Jordana Berg, e Sergio Mekler.
Outro motivo foi a presença de representantes da National Film and Television School (NTFS), de Londres e do Centro Sperimentale di Cinema, de Roma, que estão entre as melhores escolas do mundo.
Mas a razão principal foi a presença de Roberto Perpignani, Yann Dedet, Mick Audsley , Sylvia Ingemarsdotter e Eduardo Escorel, montadores que trabalharam com mestres do porte de Orson Welles, Bernardo Bertolucci, François Truffaut, Stephen Frears, Ingmar Bergman e Glauber Rocha. Entrei numa correria desenfreada para tentar entregar as edições pendentes a tempo de ir pra São Paulo e – ufa! – consegui.
VideoGuru – Na sua opinião, quais foram os maiores destaques do Simpósio, as melhores mesas, os convidados mais legais e as informações mais importantes?
Fernando – O simpósio foi dividido em oito mesas, cada uma com três palestrantes. Os temas foram o papel criativo do montador, montagem clássica versus não clássica, montagem e pós em documentário, cinematografia, restauração, som e montagem versus roteiro.
Todas foram sensacionais. A palestra sobre restauração, por exemplo, me surpreendeu. Na mesa daquela manhã, sobre cinematografia, Cesar Charlone, José Francisco Neto e Curtis Clark haviam feito considerações e impressionantes demonstrações das possibilidades da captação digital, que já pode, inclusive, ultrapassar o espaço de cor dos filmes 35mm.
Mas quando o italiano Davide Pozzi exibiu trechos de filmes de Luchino Visconti e Sérgio Leone restaurados digitalmente, a sensação foi de arrebatamento. Foi inusitado que esse dia terminasse com a frase de Lauro Escorel “se não tem grão, não tem vida”. Eu fiquei na torcida para que a assepsia digital seja apenas uma entre as texturas disponíveis para os cineastas contemporâneos.
O inglês Larry Sider, da NTFS, criador do simpósio bienal School of Sound abriu sua exposição sobre som pedindo aos presentes que fechassem os olhos e prestassem atenção aos sons, desde os muito próximos, até os distantes, usando essa experiência sensorial para discorrer sobre o quanto a representação do som é subjetiva. Mas, nesse clima propício a divagações, quando ele definiu áudio-visual como uma dança entre esses dois elementos, comecei a pensar se essa definição não se aplicaria também ao espectador.
Se é função do montador comover o espectador (no sentido de mover junto), esse movimento não seria carregar o outro nas costas ou conduzir a massa como se tange gado, mas uma dança com todas as suas variações, aproximações e distanciamentos, vigor e suavidade.
Curiosamente essa ideia remetia à mesa da véspera, em que Yann Dedet (de A Noite Americana, entre outros) dizia que “é preciso dar tempo para o espectador se perder em seus pensamentos e voltar mais profundamente para a história” e Roberto Perpignani (O Último Tango em Paris, O Carteiro e o Poeta) atestava que “montar é confronta-se com a emoção, antes da lógica”.
Talvez Perpignani tenha feito palestra mais envolvente, contando seus quase quarenta anos de carreira numa mistura de português, espanhol, italiano, inglês e francês.
VideoGuru – Qual a importancia de eventos desse tipo para profissionais de pós-produção como você?
Fernando – As melhores ferramentas de que um montador pode dispor são um olhar original e um domínio profundo da linguagem. Ouvir as experiências dos mestres nos ensina a olhar en tous azimuts e muitas vezes uma sutil mudança de perspectiva pode não só resolver os problemas mais complicados, como abrir novos níveis de significação.
Talvez essa capacidade de re-significar o material captado seja a chave da pós-produção criativa, que era tema do simpósio.
VideoGuru – Como foi ter contato com grandes editores nos bastidores do Simpósio, entre uma mesa e outra?
Fernando – Foi um barato, deu pra trocar boas ideias com Perpignani, David Charap, Roger Critteden – o idealizador do simpósio – tanto sobre montagem quanto sobre formação, que é um ponto frágil no Brasil.
VideoGuru – É possível ter acesso às gravações das mesas de debate?
Fernando – Parece que a Cinemateca vai disponibilizar um DVD com as palestras, mas não tenho informações precisas.
VideoGuru – Você sabe se existem planos para novas edições do Simpósio? Existem eventos semelhantes fora do Brasil?
Fernando – Não sei se vão existir outras edições, espero que sim. Antes do Brasil, o simpósio aconteceu na Polônia, em Cuba, no Japão e na Inglaterra.
Veja alguns vídeos que o Fernando gravou com seu celular. Dá para sentir um pouco do clima do evento.
Na área externa da Cinemateca Brasileira, a confraternização entre os participantes, e uma difícil questão: onde ir almoçar?
No auditório da Cinemateca, onde ocorreram as mesas de debate, o publico aguarda o início de uma delas. A platéia foi pequena, muita gente inscrita, 400 no total, acabou não aparecendo. Uma pena, porque muita gente deixou de se inscrever por conta das inscrições terem se esgotado rapidamente.
A mesa sobre novas tecnologias de captação, com a participação de Cesar Charlone e Cutis Clark. Charlone conta como usou cameras de baixo custo em seus filmes mais recentes e que preferiu a exibição em digital de alguns de seus últimos trabalhos.
A exibição do filme trazido na bagagem por Curtis Clark, mostrando o resultado de sua experiência com a nova camera da Sony F65, que apresenta uma performance, em alguns aspectos, superior à película.
Valeu, Fernando! Esperamos todos que novos eventos como o Simpósio ocorram com mais frequência no Brasil e em outros países, de preferência sempre com streaming ao vivo, como foi dessa vez. O streaming é um recurso fantástico que permite a participação de pessoas de qualquer lugar do mundo, da forma mais democrática possível. Parabéns para a Cinemateca Brasileira, Maria Dora Mourão, e todos da equipe de organização do evento.
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